Posted by: CAROL
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Até hoje não se percebeu com a necessária clareza e profundidade que a nossa época, apesar do excesso de irreligiosidade, está consideravelmente sobrecarregada com o que adveio da era cristã, a saber, com o predomínio da palavra, daquele Logos que representa a figura central da fé cristã. A palavra tornou-se, ao pé da letra, o nosso deus e assim permanece mesmo para quem conhece o cristianismo apenas externamente. Palavras como “sociedade” e “Estado” concretizaram-se de tal maneira que quase chegaram a se personificar. Para a crença vulgar, o Estado se tornou, ainda mais do que o rei das épocas primitivas, o doador inesgotável de todos os bens. O Estado é invocado, responsabilizado, acusado, etc. A sociedade se transforma no princípio ético supremo, atribuindo-se-lhe inclusive a capacidade de criação. Ninguém parece observar que a veneração e o endeusamento da palavra, necessárias para uma determinada fase de desenvolvimento espiritual e histórico, traz consigo um lado sombrio bastante perigoso. Desde o momento em que a “palavra”, através de uma educação secular, adquire validade universal, ela rompe sua ligação originária com a Pessoa divina. Ao romper essa ligação, surge uma Igreja extremamente personificada e – last not least – um Estado igualmente personificado; a fé na “palavra” se transforma em crendice e a própria palavra em slogan informal, capaz de todo tipo de impostura. Com a crendice, com as propagandas e anúncios, o cidadão satura os ouvidos, assume compromissos e negócios políticos, enquanto a mentira alcança proporções jamais vistas.
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Carl G. Jung | “Presente e Futuro” (p. 35)
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