So there you have it: two things and I can’t bring them together, and they are wrenching me apart. These two feelings, this knowledge of a world so awful, this sense of a life so extraordinary – how am I to resolve them?





[…] A cold paralyzing horror: a glimpse into the subhuman… the sickness of life beginning again: the exhausting awareness of every ache. What the hand does in reaching, a misery of awareness; loss of memory in small things; hatred of necessary routines; hatred but not fear of dark; watching the skin, the fingers; overeating; a full preoccupation with unnecessary tasks; weakness in the morning; fear of headlights; distrust of children; a tide of loss.

(Theodore Roethke, notebooks)

Cenas de Annie Hall (1977), meu filme preferido de Woody Allen.


A amizade, história de perdões incessantes. Com o passar do tempo, perdemos a paciência para a história, já não nos importa perdoar e ser perdoados. Essa aeróbica interior cansa, miúda.

[…] A sabedoria do gozo, avessa à ciência do prazer. A felicidade esgotava-te, o sofrimento exaltava-te, nada era fácil para ti. “Como podes ter vivido tanto e ser tão leve?”, perguntava-mes. Eu respondia-te apenas com sorrisos. Ai de ti, se descobrisses que viver demasiado é desistir da vida. Como as crianças. Morrem num instante. Magoam-se menos. Não sabem que a morte existe. É por isso que não perdoo a tua morte. Crava-se-me nos ossos. Sou a tua morte, para que tu vivas ainda… O que viverá de ti quando eu morrer?

O teu silêncio esmaga-me. Já não sei procurar as gargalhadas, correr para a alegria momentânea dos regatos. Sou a tua vítima, agora culpado de tudo o que não fiz. Se ao menos me aparecesses, uma única vez. Faz-te fantasma, entra-me pela varandam mostra-me o teu rosto desmoronado… Quem sou eu, neste inferno deslumbrante preenchido pelo negro da tua ausência?

[…] Eu não creio no teu Deus, fujo dos deuses que nos desenham sob o rosto, à nascença, todos os pensamentos tristes da vida. Não creio em nada que arranhe a superfície rasa da vida. Tu acreditavas em tudo, para o melhor e para o pior. O meu amor por ti agora atinge o auge. Já não possuo nada a que me agarrar. Nem o teu corpo, nem a minha razão, nem a vida, lá fora. As pessoas que te conheciam não nos servem agora. Lembram-se de ti como de uma morta. Inventam-te. Fazes-me falta. Não te consigo inventar.

Porque os enredos, mesmo os mais mesquinhos, são rituais de fuga ao tédio. […] Nunca usaras a hipocondria existencial como técnica de sedução — de resto, abominavas esse gênero de aproximação, tornavas-te quase agressiva quando alguém tentava comover-te com queixas ou doenças imaginárias:

“Só no Woody Allen suporto isso. Porque ele usa a hipocondria como mera música de fundo, quase como quem pede desculpa de ser tão perfeitamente inteligente. E a maioria das pessoas usa-a em vez da inteligência. Sobretudo as mulheres, por muito que me custe admiti-lo.”

E rias. A falta que me faz esse teu riso. Quase obsceno. Apagava a luz do dia, o ruído do tédio, a gritaria das crianças do andar de baixo… Havia algo de trágico nesse teu riso, um desgosto de que o mundo fosse tão diferente dele. Uma dança de rajada sobre a pompa e a miséria. Um amor bolorento em que se mergulhava como num mar de nuvens quentes. Havia o rosto eterno da vida, nesse teu riso que morreu.


Inês Pedrosa  |  “Fazes-me Falta”  (Alfaguara, 2003, p. 95-97)


*   *   *   *   *


Uma observação: há quem use essa hipocondria existencial APESAR da inteligência. Talvez como um adereço extravagante, quem sabe, para seduzir, para manipular, para massegear o ego e fazer-se celebridade às custas de personas alheias cuja fama já está estabelecida nos “anais” da cultura. Isso sim é obsceno (não há como não deitar fora o quase), principalmente em homens — considerando-se a possibilidade de ser mais comum nas mulheres (tenho sérias dúvidas), como aponta a personagem morta, na citação acima, em sua ácida observação.

Spectre

Cena do novo filme de James Bond, Spectre (2015)


Os casamentos, como os funerais, são dias de esquecimento. Embriagamo-nos de champanhe ou lágrimas, afogamo-nos no leito grosso de ruínas sobre as quais o sangue habitualmente circula, e de repente é noite e não sabemos bem o que se passou. Só depois, nas fotografias, nos damos conta de que estivemos lá — mas dos enterros não se guardam fotografias…

Há uma energia ética nos funerais. Um desespero pelo bem que lança pó de estrelas nos olhos e apaga os pequenos ressentimentos quotidianos. Amanhã voltaremos a invejar-nos uns aos outros. A maldizer o próximo pela calada. A trair grandes amigos em pequenos cafés de negócios. A ser bonzinhos só de vez em quando. Mas amanhã não estarás cá tu para gritar que esse “de vez em quando” é que importa. Amanhã não estarás cá tu para limpar o pó à humanidade e persistir na cintilação das almas. O que é uma alma, diz-me lá? Lançavas a cabeça para trás e repetias, teatral, autêntica: “A alma é um vício”.

“Isso não é teu, é da Fanny Owen da dona Agustina“, recordava-te eu. Encolhias os ombros e rias-te: “Claro, mas esta frase transformou-me a vida. E aquilo que nos transforma é nosso, meu traste, queira ou não queira”.


Inês Pedrosa  |  “Fazes-me Falta”  (Alfaguara, 2003, p. 37 e 99)



Confundias em mim
o silêncio com a melancolia
quando assistia imóvel
à passagem do tempo
e deixei que me atravessassem
suas marcas.

O silêncio é o recorte da alma —
se estás sem medo
e desapegado
o som do vazio
preencherá o ar:
nenhum bater de asas
nenhuma folha ao vento
será audível —
a vida te inundará —
corpo e sentidos.

Serás aquele que passou
pelo silêncio dos abismos
e sobreviveu
como, creio, eu.


(Fany Aktinol)





Every artist has some form of insecurity… about what they create, whether it’s good enough, [if] it’s gonna stay at the top, or it’s gonna still speak to people. Or is it going to lose its… relevance?

You can’t worry about these things. You have to create things that are truthful. And [by] truthful… I don’t mean truthful with the big “T”, just truthful to yourself. And authentic and honest, and that resonates with the experiences and situations that you’ve gone through.

I often wish that I’d gone through harder things in life so it makes my art richer in… somewhat… some layer, questioning my own identity, for some reason…

It’s not about you. It’s not about all your talents. Because all those things formed us [most] like a pseudo reality, you know, when you find all your validation in what you do. And if you surrender yourself to it [the great abyss] then those things become less important, and you find your creativity again. You find out the reasons why you create.

Creativity… it’s not for yourself. It’s to serve others.



Um interessante experimento em macro cinematografia realizado pelo fotógrafo alemão Roman De Giuli, com um belo resultado.



Segundo o autor:


A ideia deste trabalho era encenar a gênese de um universo minúsculo, que só existe durante um tempo muito curto sobre uma placa de vidro, e depois se dissolve em um fluxo desordenado de óleo, tinta e água.

Esse universo precisava aparecer como um fenômeno bem definido, incandescente e brilhante, que lembrasse o espectador do olhar através de um telescópio. A atmosfera cheia de estrelas, planetas, nuvens e névoa emerge de grandes correntes coloridas, formando bolas e bolhas. Suas superfícies refletem o padrão do fundo, dando aos objetos uma aparência tridimensional. O espaço expande-se cada vez mais em profundidade, até que explosões de estrelas vindouras levam todo o sistema a um colapso. A ilusão decompõe-se em uma mancha escura de substâncias misturadas, e desaparece tão rapidamente quanto surgiu

As áreas que podemos ver neste curta-metragem tem apenas alguns centímetros quadrados, sendo algumas vezes menores do que uma moeda. Os fluxos e interações de fluidos não são visíveis a olho nu; precisam ser capturados por uma lente macro de 1:1 e algumas luzes LED muito brilhantes.

Levei cerca de 70 horas para gravar, tentando e falhando até ser capaz de capturar imagens com um caráter orgânico e não artificial, criando um cosmos realmente fidedigno. Na edição, as filmagens foram apenas aceleradas e sofreram correção de cor, mas sem qualquer composição ou CGI.


(Tradução de Jussara Almeida)